quinta-feira, 12 de novembro de 2015

[Resenha] A Extraordinária Viagem do Faquir Que Ficou Preso Em Um Armário Ikea

Nome: A Extraordinária Viagem do Faquir Que Ficou Preso Em Um Armário Ikea
Autor: Romain Puértolas
Edição: 1/2014
Editora: Record
Páginas: 256

Sinopse: A figura de um faquir está associada à meditação, ao treinamento e à magia. Mas, no caso de Ajatashatru Ahvaka Singh, é mais provável que o público se depare com truques e trapaças. A última de suas artimanhas foi convencer sua aldeia a pagar por uma viagem à França para adquirir a Camadepregösa, um modelo de cama de pregos vendida pela Ikea. Só que ele não contava em ficar preso dentro de um dos armários da loja. Nem que o móvel seria despachado para outro país. Assim, o faquir e seu turbante partem para uma aventura, ainda que involuntária, pelo mundo, fazendo uma horda de inimigos, alguns amigos e aprontando muitas confusões pelo caminho.




Comentários:

Já mencionei em certa ocasião como títulos estranhos tendem a chamar minha atenção de imediato, e ainda mais se forem grandes. Desse modo, A Extraordinária Viagem do Faquir Que Ficou Preso Em Um Armário Ikea despertou meu interesse não só pela capa minimalista (e bastante chamativa, diga-se de passagem) mas por esse título bastante sugestivo. A sinopse me pareceu divertida e alguns comentários aumentaram minha curiosidade. Assim sendo, adquiri o livro alguns meses após o lançamento e levei mais alguns meses para poder ler, mas valeu a pena.

Ajatashatru Ahvaka (pronuncie Achata já a tua vaca) é um faquir que, assim como qualquer outro, todos acreditam viver baseado nos princípios da meditação indiana. Exceto que na verdade ele vive de trambiques e golpes dignos de qualquer vigarista de rua. Sua maior mentira foi convencer seu povo de que a única solução para seu reumatismo era adquirir a mais nova cama de pregos da Ikea, e não pouparam esforços em juntar dinheiro para que Ajatashatru fosse até a França comprar sua cama na famosa loja de móveis suecos. A saúde do faquir dependia disso.

Munido apenas de uma nota falsa de cem euros para comprar sua cama, o faquir teria uma viajem curta porém cheia de golpes. Começando pelo taxista que se achando muito esperto decidiu levar o faquir a loja mais distante do aeroporto e acabou sem nenhum centavo. Com a viagem de retorno marcada para o dia seguinte e apenas uma nota que precisaria ter ao receber a cama também no dia seguinte, Ajatashatru pensou em se esconder na loja e passar a noite ali. E bem que parecia uma boa ideia em meio a tantos móveis confortáveis e com a cozinha do restaurante a sua disposição. Ele só não sabia que naquela mesma noite alguns móveis seriam despachados para outros países, inclusive o armário que escolheu para se esconder dos funcionários.

Assim começa uma odisseia nada convencional de passagens rápidas por alguns países, mas cheia de aventuras. De forma cômica e reflexiva acompanhamos a viagem, não só geográfica mas emocional, de Ajatashatru. Acontece que ao conhecer e interagir com as mais diferentes pessoas que acreditam nele e aceitam ajudá-lo ele passa a ver as coisas de forma diferente e querer ser uma pessoa melhor. As principais motivações para esse desejo de mudança vem de Marie, a mulher que lhe paga um almoço no restaurante da Ikea, e dos imigrantes sudaneses que tentavam chegar à Grã-Bretanha na caçamba do caminhão que levava o armário com Ajatashatru.

Mas nem todo mundo quer ajudar o faquir. Gustave, o taxista, não se conforma por ter caído num golpe e passa a persegui-lo com um desejo de vingança mortal. Essa caça rende algumas das partes mais cômicas e irreverentes da trama. Outras pessoas de índole nada amigável, como um mercenário que faz tráfico de pessoas para a Europa, também cruzam seu caminho. E a única saída que Ajatashatru encontra para escapar ileso é usando suas velhas artimanhas.

A verdade é que “A Viagem do Faquir” (chamarei assim pra não ficar muito extenso) trata de assuntos delicados de uma forma que faz o leitor refletir quase sem perceber, graças ao seu humor quase satírico. Romain Puértolas usou da experiência que teve no tempo que trabalhou como policial de fronteira na França para falar sobre imigração ilegal e tráfico de pessoas, as dificuldades e injustiças pelas quais passam essas pessoas que só querem a perspectiva de uma vida melhor. E ainda construiu para Ajatashatru um passado de miséria e abuso sexual que, não justifica, mas, faz o leitor compreender a vida de trambiques que escolheu como modo de sobrevivência e defesa.

Com uma narrativa fluída feita em terceira pessoa que consegue explorar muito bem os pensamentos e emoções do personagens, o leitor passa pelas páginas quase sem perceber. Os capítulos são curtos e sem numeração, o que contribui um pouco para a perda de noção do quanto já se passou. A trama ainda é dividida em partes nomeadas pelos países que Ajatashatru passa. O humor e a linguagem simples empregadas por Puértolas só fazem com que o leitor nunca queira parar. E os nomes complicados ganharam pronúncias hilárias do autor, mas penso que não deve sido fácil para o tradutor Mauro Pinheiro. Se ele precisou adaptar algo com o propósito de manter a graça, está de parabéns.

A única crítica que tenho sobre “A Viagem do Faquir” é a respeito do final, que achei um pouco rápido demais e até meio atropelado. Mas nada que tire o brilho da obra que a propósito, está mais do que recomendada. E mal posso esperar pela oportunidade de conferir outras obras de Romain Puértolas.

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